m dos po§os do o¡sis. ­ Talvez seja melhor perguntarmos ­ disse o rapaz. O Inglªs n£o queria contar aos outros sua presen§a no O¡sis, e ficou bastante indeciso. Mas acabou concordando e pediu ao rapaz, que falava melhor o ¡rabe, para fazer isto. O rapaz se aproximou de uma mulher que havia chegado no po§o para encher de ¡gua um saco de pele de carneiro. ­ Boa tarde, senhora. Gostaria de saber onde vive um Alquimista neste o¡sis ­ perguntou o rapaz. A mulher disse que jamais havia ouvido falar disso, e foi imediatamente embora. Antes, por©m, avisou ao rapaz que n£o deveria conversar com mulheres vestidas de preto, porque eram mulheres casadas. Ele tinha que respeitar a Tradi§£o. O Inglªs ficou decepcionad­ssimo. Tinha feito toda a sua viagem por nada. O rapaz tamb©m ficou triste; seu companheiro tamb©m estava em busca de sua Lenda Pessoal. E quando algu©m faz isto, o Universo todo se esfor§a para que a pessoa consiga o que deseja, dissera o velho rei. Ele n£o podia estar enganado. ­ Eu nunca tinha ouvido falar antes de alquimistas ­ disse o rapaz. ­ Sen£o tentaria ajud¡-lo. Alguma coisa brilhou nos olhos do Inglªs. ­ ‰ isto! Talvez ningu©m aqui saiba o que © um alquimista! Pergunte pelo homem que cura todas as doen§as da aldeia! V¡rias mulheres vestidas de preto vieram buscar ¡gua no po§o, e o rapaz n£o conversou com elas, por mais que o Inglªs insistisse. At© que um homem se aproximou. ­ Conhece algu©m que cura as doen§as da aldeia? ­ perguntou o rapaz. ­ Allah cura todas as doen§as, ­ disse o homem, visivelmente apavorado com os estrangeiros. ­ Vocªs est£o em busca de bruxos. E depois de dizer alguns vers­culos do Alcor£o, seguiu seu caminho. Um outro homem se aproximou. Era mais velho, e trazia apenas um pequeno balde. O rapaz repetiu a pergunta. ­ Por que vocªs querem conhecer este tipo de homem? ­ respondeu o ¡rabe com outra pergunta. ­ Porque meu amigo viajou muitos meses para encontr¡-lo ­ disse o rapaz. ­ Se este homem existe no o¡sis, deve ser muito poderoso ­ disse o velho, depois de pensar por alguns instantes. ­ Nem os chefes tribais conseguiriam vª-lo quando precisam. Sã quando ele assim determinasse. "Esperem o final da guerra. E ent£o partam com a caravana. N£o procurem entrar na vida do o¡sis", concluiu, se afastando. Mas o Inglªs ficou exultante. Estavam na pista certa. Finalmente surgiu uma mo§a que n£o estava vestida de negro. Trazia um c¢ntaro no ombro, e a cabe§a coberta com um v©u, mas tinha o rosto descoberto. O rapaz aproximou-se para perguntar sobre o Alquimista. Ent£o foi como se o tempo parasse, e a Alma do Mundo surgisse com toda a for§a diante do rapaz. Quando ele olhou seus olhos negros, seus l¡bios indecisos entre um sorriso e o silªncio, ele entendeu a parte mais importante e mais s¡bia da Linguagem que o mundo falava, e que todas as pessoas da terra eram capazes de entender em seus cora§åes. E isto era chamado de Amor, uma coisa mais antiga que os homens e que o prãprio deserto, e que no entanto ressurgia sempre com a mesma for§a onde quer que dois pares de olhos se cruzassem como se cruzaram aqueles dois pares de olhos diante de um po§o. Os l¡bios finalmente resolveram dar um sorriso, e aquilo era um sinal, o sinal que ele esperou sem saber durante tanto tempo em sua vida, que tinha buscado nas ovelhas e nos livros, nos cristais e no silªncio do deserto. Ali estava a pura linguagem do mundo, sem explica§åes, porque o Universo n£o precisava de explica§åes para continuar seu caminho no espa§o sem fim. Tudo o que o rapaz entendia naquele momento era que estava diante da mulher de sua vida, e sem nenhuma necessidade de palavras, ela devia saber disto tamb©m. Tinha mais certeza disto do que de qualquer coisa no mundo, mesmo que seus pais, e os pais de seus pais dissessem que era preciso namorar, noivar, conhecer a pessoa e ter dinheiro antes de se casar. Quem dizia isto talvez jamais tivesse conhecido a linguagem universal, porque quando se mergulha nela, © f¡cil entender que sempre existe no mundo uma pessoa que espera a outra, seja no meio de um deserto, seja no meio das grandes cidades. E quando estas pessoas se cruzam, e seus olhos se encontram, todo o passado e todo o futuro perde qualquer import¢ncia, e sã existe aquele momento, e aquela certeza incr­vel de que todas as coisas debaixo do sol foram escritas pela mesma M£o. A M£o que desperta o Amor, e que fez uma alma gªmea para cada pessoa que trabalha, descansa e busca tesouros debaixo do sol. Porque sem isto n£o haveria qualquer sentido para os sonhos da ra§a humana. "Maktub", pensou o rapaz. O Inglªs levantou-se de onde estava sentado e sacudiu o rapaz. ­ Vamos, pergunte a ela! O rapaz se aproximou da mo§a. Ela tornou a sorrir. Ele sorriu tamb©m. ­ Como vocª se chama? ­ perguntou. ­ Me chamo F¡tima ­ disse a mo§a, olhando para o ch£o. ­ ‰ um nome que algumas mulheres tem na terra de onde venho. ­ ‰ o nome da filha do Profeta ­ disse F¡tima. ­ Os guerreiros os levaram para l¡. A mo§a delicada falava de guerreiros com orgulho. Ao seu lado o Inglªs insistia, e o rapaz perguntou pelo homem que curava todas as doen§as. ­ ‰ um homem que conhece os segredos do mundo. Conversa com os djins do deserto ­ ela falou. Os djins eram os demänios. E a mo§a apontou para o sul, para o lugar onde aquele estranho homem morava. Depois encheu seu c¢ntaro e partiu. O Inglªs partiu tamb©m, em busca do Alquimista. E o rapaz ficou por muito tempo sentado ao lado do po§o, entendendo que algum dia o Levante havia deixado em seu rosto o perfume daquela mulher, e que j¡ a amava antes mesmo de saber que ela existia, e que seu amor por ela faria com que encontrasse todos os tesouros do mundo. No dia seguinte o rapaz voltou para o po§o, para esperar a mo§a. Para sua surpresa, encontrou l¡ o Inglªs, olhando pela primeira vez o deserto. ­ Esperei a tarde e a noite ­ disse o Inglªs. ­ Ele chegou junto com as primeiras estrelas. Eu lhe contei o que estava procurando. Ent£o ele me perguntou se j¡ havia transformado chumbo em ouro. Eu disse que era isto que queria aprender. "Ele me mandou tentar. Foi tudo que me disse: v¡ tentar". O rapaz ficou quieto. O Inglªs havia viajado tanto para ouvir o que j¡ sabia. A­ ele se lembrou de que tinha dado seis ovelhas ao velho rei pela mesma raz£o. ­ Ent£o tente ­ disse para o Inglªs. ­ ‰ isto que vou fazer. E vou come§ar agora. Pouco depois que o Inglªs saiu, F¡tima chegou para apanhar ¡gua com seu c¢ntaro. ­ Vim dizer-lhe uma coisa simples ­ falou o rapaz. ­ Eu quero que vocª seja minha mulher. Eu te amo. A mo§a deixou que seu c¢ntaro derramasse a ¡gua. ­ Vou esper¡-la todos os dias aqui. Cruzei o deserto em busca de um tesouro que se encontra perto das pir¢mides. A guerra foi para mim uma maldi§£o. Agora ela © uma bªn§£o, porque me deixa perto de vocª. ­ A guerra um dia vai acabar ­ disse a mo§a. O rapaz olhou as tamareiras do o¡sis. Havia sido pastor. E ali existiam muitas ovelhas. F¡tima era mais importante que o tesouro. ­ Os guerreiros buscam seus tesouros ­ disse a mo§a, como se estivesse adivinhando o pensamento do rapaz. ­ E as mulheres do deserto tªm orgulho dos seus guerreiros. Depois tornou a encher seu c¢ntaro, e foi embora. Todos os dias o rapaz ia para o po§o esperar F¡tima. Contou-lhe de sua vida de pastor, do rei, da loja de cristais. Ficaram amigos, e com exce§£o quinze minutos que passava com ela, o resto do dia custava infinitamente a passar. Quando j¡ estava h¡ quase um mªs no o¡sis, o L­der da Caravana convocou a todos para uma reuni£o. ­ N£o sabemos quando a guerra vai acabar, e n£o podemos seguir viagem ­ disse. ­ Os combates devem durar por muito tempo, talvez muitos anos. Existem guerreiros fortes e valentes de ambos os lados, e existe a honra de combater em ambos os ex©rcitos. N£o © uma guerra entre bons e maus. ‰ uma guerra entre for§as que lutam pelo mesmo poder, e quando este tipo de batalha come§a, demora mais que as outras ­ porque Allah est¡ dos dois lados. As pessoas se dispersaram. O rapaz tornou a encontrar-se com F¡tima aquela tarde, e contou da reuni£o. ­ No segundo dia que nos encontramos ­ disse F¡tima ­ vocª me falou do seu amor. Depois me ensinou coisas belas, como a Linguagem e a Alma do Mundo. Tudo isto me faz aos poucos ser parte de vocª. O rapaz ouvia sua voz, e achava mais bela que o barulho do vento nas folhas das tamareiras. ­ Faz muito tempo, que estive aqui neste po§o esperando por vocª. N£o consigo me lembrar do meu passado, da Tradi§£o, da maneira que os homens esperam que se comportem as mulheres do deserto. Desde crian§a eu sonhava que o deserto ia me trazer o maior presente de minha vida. Este presente chegou afinal, e © vocª. O rapaz pensou em tocar sua m£o. Mas F¡tima segurava as al§as do c¢ntaro. ­ Vocª me falou dos seus sonhos, do velho rei, e do tesouro. Vocª me falou dos sinais. Ent£o n£o tenho medo de nada, porque foram estes sinais que me trouxeram vocª. E eu sou parte do seu sonho, da sua Lenda Pessoal, como vocª costuma chamar. "Por isso quero que siga em dire§£o ao que veio buscar. Se tiver que esperar o final da guerra, muito bem. Mas se tiver que seguir antes, v¡ em dire§£o   sua lenda. As dunas mudam com o vento, mas o deserto permanece no mesmo. Assim ser¡ com nosso amor. "Maktub" ­ disse. "Se eu for parte de sua Lenda, vocª voltar¡ um dia". O rapaz saiu triste do encontro com F¡tima. Ele se lembrava de muita gente que havia conhecido. Os pastores casados tinham muita dificuldade em convencer suas esposas de que precisavam andar pelos campos. O amor exigia estar junto da pessoa amada. No dia seguinte ele contou tudo isto   F¡tima. ­ O deserto leva nossos homens e nem sempre os traz de volta ­ disse ela. ­ Ent£o nos acostumamos com isto. E eles passam a existir nas nuvens sem chuva, nos animais que se escondem entre as pedras, na ¡gua que sai generosa da terra. Eles passam a fazer parte de tudo, passam a ser a Alma do Mundo. "Alguns retornam. E ent£o todas as outras mulheres ficam felizes, porque os homens que elas esperam tamb©m podem voltar um dia. Antes eu olhava estas mulheres, e invejava sua felicidade. Agora vou ter tamb©m uma pessoa para esperar. "Sou uma mulher do deserto e me orgulho disto. Quero que meu homem tamb©m caminhe livre como o vento que move as dunas. Quero tamb©m poder ver meu homem nas nuvens, nos animais e na ¡gua." O rapaz foi procurar o Inglªs. Queria contar-lhe sobre F¡tima. Ficou surpreso quando viu que o Inglªs havia constru­do um pequeno forno ao lado de sua tenda. Era um forno estranho, com um frasco transparente em cima. O Inglªs alimentava o fogo com lenha, e olhava o deserto. Seus olhos pareciam ter mais brilho quando passava o tempo todo lendo livros. ­ Esta © a primeira fase do trabalho ­ disse o Inglªs. ­ Tenho que separar o enxofre impuro. Para isto, nao posso ter medo de falhar. O meu medo de falhar foi que me impediu de tentar a Grande Obra at© hoje. ‰ agora que estou come§ando o que podia ter come§ado h¡ dez anos atr¡s. Mas me sinto feliz de n£o ter esperado vinte anos para isto. E continuou a alimentar o fogo e a olhar o deserto. O rapaz ficou ao seu lado por algum tempo, at© que o deserto come§ou a ficar rosado com a luz do entardecer. Ent£o ele sentiu uma imensa vontade de ir at© l¡, para ver se o silªncio conseguia responder suas perguntas. Caminhou sem destino por algum tempo, mantendo as tamareiras do o¡sis ao alcance de seus olhos. Escutava o vento, e sentia as pedras sob seus p©s. €s vezes encontrava alguma concha, e sabia que aquele deserto, num tempo remoto, havia sido um grande mar. Depois sentou-se numa pedra e deixou-se hipnotizar pelo horizonte que existia na sua frente. N£o conseguia entender o Amor sem o sentimento de posse; mas F¡tima era uma mulher do deserto, e se algu©m podia lhe ensinar isto, era o deserto. Ficou assim, sem pensar em nada, at© que pressentiu um movimento sobre sua cabe§a. Olhando para o c©u, viu que eram dois gaviåes, voando muito alto. O rapaz come§ou a olhar os gaviåes, e os desenhos que eles faziam no c©u. Parecia uma coisa desordenada, entretanto, tinham algum sentido para o rapaz. Apenas n£o conseguia compreender seu significado. Decidiu ent£o que devia acompanhar com os olhos o movimento dos p¡ssaros, e talvez pudesse ler alguma coisa. Talvez o deserto pudesse lhe explicar o amor sem posse. Come§ou a sentir sono. Seu cora§£o pediu para que n£o dormisse: ao inv©s disto, devia se entregar. "Estava penetrando na Linguagem do Mundo, e tudo nesta terra faz sentido, at© mesmo o väo de gaviåes", disse. E aproveitou para agradecer pelo fato de estar cheio de amor por uma mulher. "Quando se ama, as coisas fazem ainda mais sentido", pensou. De repente, um gavi£o deu um r¡pido mergulho no c©u e atacou o outro. Quando fez este movimento, o rapaz teve uma sêbita e r¡pida vis£o: um ex©rcito, de espadas desembainhadas, entrando no o¡sis. A vis£o logo sumiu, mas aquilo lhe deixou sobressaltado. Havia ouvido falar das miragens, e j¡ havia visto algumas: eram desejos que se materializavam sobre a areia do deserto. Entretanto, ele n£o desejava um ex©rcito invadindo o o¡sis. Pensou em esquecer aquilo e voltar   sua medita§£o. Tentou novamente concentrar-se no deserto cär-de-rosa e nas pedras. Mas alguma coisa em seu cora§£o n£o o deixava quieto. "Siga sempre os sinais", dissera o velho rei. E o rapaz pensou em F¡tima. Lembrou-se do que havia visto, e pressentiu que estava prãximo de acontecer. Com muita dificuldade, saiu do transe em que havia entrado. Levantou-se, e come§ou a caminhar em dire§£o  s tamareiras. Mais uma vez percebia as muitas linguagens das coisas: desta vez, o deserto era seguro, e o o¡sis se transformara em perigo. O cameleiro estava sentado aos p©s de uma tamareira, tamb©m olhando o pär-do-sol. Viu quando o rapaz surgiu por detr¡s de uma das dunas. ­ Um ex©rcito se aproxima ­ disse. ­ Tive uma vis£o. ­ O deserto enche de visåes o cora§£o de um homem ­ respondeu o cameleiro. Mas o rapaz lhe contou dos gaviåes: estava olhando seu väo quando tinha mergulhado de repente na Alma do Mundo. O cameleiro ficou quieto; entendia o que o rapaz estava falando. Sabia que qualquer coisa na face da terra pode contar a histãria de todas as coisas. Se abrisse um livro em qualquer p¡gina, ou olhasse as m£os das pessoas, ou cartas de baralho, ou väo dos p¡ssaros, ou seja l¡ o que fosse, qualquer pessoa iria encontrar um la§o com a coisa que estava vivendo. Na verdade, n£o eram as coisas que mostravam nada; eram as pessoas que, olhando para as coisas, descobriam a maneira de penetrar na Alma do Mundo. O deserto estava cheio de homens que ganhavam a vida porque podiam penetrar com facilidade na Alma do Mundo. Eram conhecidos por Adivinhos, e temidos por mulheres e velhos. Os Guerreiros raramente os consultavam, porque era imposs­vel entrar numa batalha sabendo quando se vai morrer. Os Guerreiros preferiam o sabor da luta e a emo§£o do desconhecido; o futuro havia sido escrito por Allah, e o que quer que Ele tivesse escrito, era sempre para o bem do homem. Ent£o os Guerreiros viviam apenas o presente, porque o presente era cheio de surpresas, e eles tinham que prestar aten§£o em muitas coisas: onde estava a espada do inimigo, onde estava seu cavalo, qual o prãximo golpe que devia desferir para salvar a vida. O cameleiro n£o era Guerreiro, e j¡ havia consultado alguns adivinhos. Muitos disseram coisas certas, outros disseram coisas erradas. At© que um deles, o mais velho (e o mais temido), perguntou porque o cameleiro estava t£o interessado em saber o futuro. ­ Para que possa fazer as coisas ­ respondeu o cameleiro. ­ E mudar o que n£o gostaria que acontecesse. ­ Ent£o deixar¡ de ser seu futuro ­ respondeu o adivinho. ­ Talvez ent£o eu queira saber o futuro para me preparar para as coisas que vir£o. ­ Se forem coisas boas, isto ser¡ uma agrad¡vel surpresa ­ disse o adivinho. ­ Se forem coisas ruins, vocª estar¡ sofrendo muito antes delas acontecerem. ­ Quero saber o futuro porque sou um homem ­ disse o cameleiro para o adivinho. E os homens vivem em fun§£o do seu futuro. O adivinho ficou quieto por algum tempo. Ele era especialista no jogo de varetas, que eram atiradas no ch£o e interpretadas da maneira que ca­am. Naquele dia ele n£o jogou as varetas. Envolveu-as num len§o e tornou a colocar no bolso. ­ Ganho a vida adivinhando o futuro das pessoas ­ disse ele. ­ Conhe§o a ciªncia das varetas, e sei como utiliz¡-la para penetrar neste espa§o onde tudo est¡ escrito. Ali posso ler o passado, descobrir o que j¡ foi esquecido, e entender os sinais do presente. "Quando as pessoas me consultam, eu n£o estou lendo o futuro; estou adivinhando o futuro. Porque o futuro pertence a Deus, e ele sã o revela em circunst¢ncias extraordin¡rias. E como consigo adivinhar o futuro? Pelos sinais do presente. No presente © que est¡ o segredo; se vocª prestar aten§£o no presente, poder¡ melhor¡-lo. E se vocª melhorar o presente, o que acontecer¡ depois tamb©m ser¡ melhor. Esque§a o futuro e viva cada dia de sua vida nos ensinamentos da Lei, e na confian§a de que Deus cuida dos seus filhos. Cada dia traz em si a Eternidade". O cameleiro quis saber quais as circunst¢ncias em que Deus permitia ver o futuro: ­ Quando Ele mesmo o mostra. E Deus mostra o futuro raramente, e por uma ênica raz£o: © um futuro que foi escrito para ser mudado. Deus tinha mostrado um futuro ao rapaz, pensou o cameleiro. Porque queria que o rapaz fosse o Seu instrumento. ­ V¡ falar com os chefes tribais ­ disse o cameleiro. ­ Conte dos guerreiros que se aproximam. ­ Eles v£o rir de mim. ­ S£o homens do deserto, e os homens do deserto est£o acostumados com os sinais. ­ Ent£o j¡ devem saber. ­ N£o est£o preocupados com isto. Acreditam que se tiverem que saber algo que Allah deseje lhe contar, alguma pessoa lhes dir¡ isto. J¡ aconteceu muitas vezes antes. Mas hoje, esta pessoa © vocª. O rapaz pensou em F¡tima. E resolveu ir ver os chefes tribais. ­ Trago sinais do deserto ­ disse ao guarda que ficava na porta da imensa tenda branca no centro do o¡sis. ­ Quero ver os chefes. O guarda n£o disse nada. Entrou e demorou-se muito l¡ dentro. Depois saiu com um ¡rabe jovem, vestido de branco e ouro. O rapaz contou ao jovem o que havia visto. Ele pediu que esperasse um pouco e tornou a entrar. A noite caiu. Entraram e sa­ram v¡rios ¡rabes e mercadores. Aos poucos as fogueiras foram se apagando, e o o¡sis come§ou a ficar t£o silencioso como o deserto. Sã a luz da grande tenda continuava acesa. Durante todo este tempo, o rapaz pensava em F¡tima, ainda sem entender a conversa daquela tarde. Finalmente, depois de muitas horas de espera, o guarda mandou que o rapaz entrasse. O que viu deixou-o extasiado. Nunca poderia imaginar que, no meio do deserto, existisse uma tenda como aquela. O ch£o estava coberto com os mais belos tapetes que j¡ havia pisado, e do teto pendiam lustres de metal amarelo trabalhado, coberto de velas acessas. Os chefes tribais estavam sentados no fundo da tenda, em semic­rculo, descansando seus bra§os e pernas em almofadas de seda com ricos bordados. Criados entravam e sa­am com bandejas de prata cheias de especiarias e ch¡. Alguns se encarregavam de manter acesas as brasas dos narguil©s. Um suave perfume de fumo enchia o ambiente. Haviam oito chefes, mas o rapaz logo percebeu quem era o mais importante: um ¡rabe vestido de branco e ouro, sentado no centro do semic­rculo. Ao seu lado estava o jovem ¡rabe com quem tinha conversado antes. ­ Quem © o estrangeiro que fala de sinais? ­ perguntou um dos chefes, olhando para ele. ­ Eu sou ­ respondeu. E contou o que havia visto. ­ E por que o deserto ia contar isto a um estranho, quando sabe que estamos h¡ v¡rias gera§åes aqui? ­ disse outro chefe tribal. ­ Porque meus olhos ainda n£o se acostumaram com o deserto ­ respondeu o rapaz. ­ E eu posso ver coisas que os olhos habituados demais n£o conseguem mais ver. "‰ porque eu sei da Alma do Mundo", pensou consigo mesmo. Mas n£o falou nada, porque os ¡rabes n£o acreditam nestas coisas. ­ O O¡sis © um terreno neutro. Ningu©m ataca um O¡sis ­ disse um terceiro chefe. ­ Eu conto apenas o que vi. Se n£o quiserem acreditar, n£o fa§am nada. Um completo silªncio abateu-se sobre a tenda, seguido de uma exaltada conversa entre os chefes tribais. Falavam num dialeto ¡rabe que o rapaz n£o entendia, mas quando ele fez men§£o de ir embora, um guarda disse para ficar. O rapaz come§ou a sentir medo; os sinais diziam que havia alguma coisa errada. Lamentou haver conversado com o cameleiro a respeito. De repente, o velho que estava no centro deu um sorriso quase impercept­vel, e o rapaz tranqìilizou-se. O velho n£o havia participado da discuss£o, e n£o dissera uma palavra at© aquele momento. Mas o rapaz j¡ estava acostumado com a Linguagem do Mundo, e pode sentir uma vibra§£o de Paz cruzando a tenda de ponta a ponta. Sua intui§£o dizia que havia agido corretamente em vir. A discuss£o acabou. Ficaram em silªncio por algum tempo, ouvindo o velho. Depois, ele se virou para o rapaz: desta vez seu rosto estava frio e distante. ­ H¡ dois mil anos, numa terra distante, jogaram num po§o e venderam como escravo um homem que acreditava em sonhos ­ disse o velho. ­ Nossos mercadores o compraram e o trouxeram para o Egito. E todos nãs sabemos que, quem acredita em sonhos, tamb©m sabe interpret¡-los. "Embora nem sempre consiga realiz¡-los", pensou o rapaz, lembrando-se da velha cigana. ­ Por causa dos sonhos do faraã com vacas magras e gordas, este homem livrou o Egito da fome. Seu nome era Jos©. Era tamb©m um estrangeiro numa terra estrangeira, como vocª, e devia ter mais ou menos a sua idade. O silªncio continuou. Os olhos do velho se mantinham frios. ­ Sempre seguimos a Tradi§£o. A Tradi§£o salvou o Egito da fome naquela ©poca, e o fez o mais rico entre os povos. A Tradi§£o ensina como os homens devem atravessar o deserto e casar suas filhas. A Tradi§£o diz que um O¡sis © um terreno neutro, porque ambos os lados tem O¡sis, e s£o vulner¡veis. Ningu©m disse qualquer palavra enquanto o velho falava. ­ Mas a Tradi§£o diz tamb©m para acreditarmos nas mensagens do deserto. Tudo que sabemos foi o deserto que nos ensinou. O velho fez um sinal e todos os ¡rabes se levantaram. A reuni£o estava para terminar. Os narguil©s foram apagados, e os guardas se colocaram em posi§£o de sentido. O rapaz preparou-se para sair, mas o velho falou ainda mais uma vez: ­ Amanh£ nãs vamos romper um acordo que diz que ningu©m no o¡sis pode portar armas. Durante o dia inteiro aguardaremos os inimigos. Quando o sol descer no horizonte, os homens me devolver£o as armas. Para cada dez inimigos mortos, vocª receber¡ uma moeda de ouro. "Entretanto, as armas n£o podem sair do seu lugar sem experimentarem a batalha. S£o caprichosas como o deserto, e se as acostumamos com isto, da prãxima vez podem ter pregui§a de disparar. Se nenhuma delas tiver sido utilizada amanh£, pelo menos uma ser¡ usada em vocª." O o¡sis estava iluminado apenas pela lua cheia quando o rapaz saiu. Eram vinte minutos de caminhada at© sua tenda, e ele come§ou a andar. Estava assustado com tudo que havia acontecido. Tinha mergulhado na Alma do Mundo, e o pre§o por acreditar naquilo era a sua vida. Uma aposta alta. Mas tinha apostado alto desde o dia em que havia vendido suas ovelhas para seguir sua Lenda Pessoal. E como dizia o cameleiro, morrer amanh£ era t£o bom como morrer em qualquer outro dia. Todo dia era feito para ser vivido ou para abandonar o mundo. Tudo dependia apenas de uma palavra: "Maktub". Caminhou em silªncio. N£o estava arrependido. Se morresse amanh£, seria porque Deus n£o estava com vontade de mudar o futuro. Mas teria morrido depois de haver cruzado o estreito, trabalhado em uma loja de cristais, conhecido o silªncio do deserto e os olhos de F¡tima. Tinha vivido intensamente cada um dos seus dias, desde que havia sa­do de casa, h¡ tanto tempo atr¡s. Se morresse amanh£, seus olhos teriam visto muito mais coisas do que os olhos dos outros pastores, e o rapaz tinha orgulho disto. De repente ouviu um estrondo, e foi jogado subitamente por terra, com o impacto de um vento que n£o conhecia. O lugar encheu-se de poeira, que quase cobriu a lua. Na sua frente, um enorme cavalo branco empinou soltando um relincho aterrador. O rapaz mal podia ver o que se passava, mas quando a poeira assentou um pouco, sentiu um pavor que jamais havia sentido antes. Em cima do cavalo estava um cavaleiro todo vestido de negro, com um falc£o em seu ombro esquerdo. Usava um turbante e um len§o que lhe cobria todo o rosto, deixando apenas os olhos de fora. Parecia o mensageiro do deserto, mas sua presen§a era mais forte do que todas as pessoas que havia conhecido na vida. O estranho cavaleiro puxou a enorme espada curva que trazia presa   sela. O a§o brilhou com a luz da lua. ­ Quem ousou ler o väo dos gaviåes? ­ perguntou com uma voz t£o forte que pareceu ecoar entre as cinqìenta mil tamareiras do Al-fayoum. ­ Eu ousei ­ disse o rapaz. Lembrou-se imediatamente da imagem de Santiago Matamouros do seu cavalo branco com os infi©is sob as patas. Era exatamente assim. Sã que agora a situa§£o estava invertida. ­ Eu ousei ­ repetiu o rapaz, e abaixou a cabe§a para receber o golpe da espada. ­ Muitas vidas ser£o salvas, porque vocªs n£o contavam com a Alma do Mundo. A espada, por©m, n£o desceu r¡pido. A m£o do estranho foi abaixando lentamente, at© que a ponta da l¢mina tocou na testa do rapaz. Era t£o afiada que saiu uma gota de sangue. O cavaleiro estava completamente imãvel. O rapaz tamb©m. N£o pensou um minuto sequer em fugir. Dentro do seu cora§£o, uma estranha alegria tomou conta dele: ia morrer por sua Lenda Pessoal. E por F¡tima. Os sinais eram verdadeiros, enfim. Ali estava o Inimigo, e por causa disto ele n£o precisava se preocupar com a morte, porque havia uma Alma do Mundo. Daqui a pouco ele estaria fazendo parte dela. E amanh£ o Inimigo faria parte dela tamb©m. O estranho, por©m, apenas mantinha a espada em sua testa. ­ Por que vocª leu o väo dos p¡ssaros? ­ Li apenas o que os p¡ssaros queriam contar. Eles querem salvar o o¡sis, e vocªs morrer£o. O o¡sis tem mais homens que vocªs. A espada continuava em sua testa. ­ Quem © vocª para mudar o destino de Allah? ­ Allah fez os ex©rcitos, e fez tamb©m os p¡ssaros. Allah me mostrou a linguagem dos p¡ssaros. Tudo foi escrito pela mesma M£o, ­ disse o rapaz, lembrando as palavras do cameleiro. O estranho finalmente retirou a espada da testa. O rapaz sentiu um certo al­vio. Mas n£o podia fugir. ­ Cuidado com as adivinha§åes ­ disse o estranho. ­ Quando as coisas est£o escritas, n£o h¡ como evit¡-las. ­ Apenas vi um ex©rcito ­ disse o rapaz. ­ N£o vi o resultado de uma batalha. O cavaleiro parecia contente com a resposta. Mas mantinha a espada na sua m£o. ­ O que faz um estrangeiro numa terra estrangeira? ­ Busco minha Lenda Pessoal. Algo que vocª n£o entender¡ nunca. O cavaleiro colocou a espada na bainha, e o falc£o no seu ombro deu um grito estranho. O rapaz come§ou a relaxar. ­ Precisava testar sua coragem ­ disse o estranho. ­ A coragem © o dom mais importante para quem busca a Linguagem do Mundo. O rapaz ficou surpreso. Aquele homem estava falando em coisas que pouca gente conhecia. ­ ‰ preciso n£o relaxar nunca, mesmo tendo chegado t£o longe ­ continuou ele. ­ ‰ preciso amar o deserto, mas jamais confiar inteiramente nele. Porque o deserto © uma prova para todos os homens: testa cada passo, e mata quem se distrai. Suas palavras lembravam as palavras do velho rei. ­ Se os guerreiros chegarem, e sua cabe§a ainda estiver sobre o pesco§o depois que o sol morrer, me procure ­ disse o estranho. A mesma m£o que havia segurado a espada, empunhou um chicote. O cavalo empinou de novo, levantando uma nuvem de poeira. ­ Onde vocª mora? ­ gritou o rapaz, enquanto o cavaleiro se afastava. A m£o com chicote apontou em dire§£o ao sul. O rapaz tinha encontrado o Alquimista. Na manh£ seguinte haviam dois mil homens armados entre as tamareiras de Al-Fayoum. Antes que o sol chegasse ao topo do c©u, quinhentos guerreiros apareceram no horizonte. Os cavaleiros entraram no o¡sis pela parte norte; parecia uma expedi§£o de paz, mas haviam armas escondidas sobre os mantos brancos. Quando chegaram perto da grande tenda que ficava no centro de Al-Fayoum, puxaram as cimitarras e as espingardas. E atacaram uma tenda vazia. Os homens do o¡sis cercaram os cavaleiros do deserto. Em meia hora haviam quatrocentos e noventa e nove corpos espalhados pelo ch£o. As crian§as estavam no outro extremo do bosque de tamareiras, e n£o viram nada. As mulheres rezavam por seus maridos nas tendas, e tamb©m n£o viram nada. N£o fosse pelos corpos espalhados, o o¡sis parecia viver um dia normal. Apenas um guerreiro foi poupado, o comandante do batalh£o. De tarde ele foi conduzido diante dos chefes tribais, que lhe perguntaram porque havia rompido a Tradi§£o. O comandante disse que seus homens estavam com fome e sede, exaustos por tantos dias de batalha, e haviam decidido tomar um o¡sis para poder recome§ar a luta. O chefe tribal disse que sentia pelos guerreiros, mas a Tradi§£o jamais pode ser rompida. A ênica coisa que muda no deserto s£o as dunas, quando sopra o vento. Depois condenou o comandante a uma morte sem honra. Ao inv©s do a§o ou da bala de fuzil, ele foi enforcado numa tamareira tamb©m morta. Seu corpo balan§ou com o vento do deserto. O chefe tribal chamou o estrangeiro e lhe deu cinqìenta moedas de ouro. Depois tornou a recordar a histãria de Jos© no Egito, e pediu para que fosse o Conselheiro do O¡sis. Quando o sol se päs por completo, e as primeiras estrelas come§aram a aparecer (n£o brilhavam muito, porque a lua cheia continuava), o rapaz andou em dire§£o ao sul. Havia apenas uma tenda, e alguns ¡rabes que passavam diziam que o lugar era cheio de djins. Mas o rapaz sentou-se e esperou durante muito tempo. O Alquimista apareceu quando a lua j¡ estava alto no c©u. Trazia dois gaviåes mortos no ombro. ­ Aqui estou ­ disse o rapaz. ­ N£o devia estar ­ respondeu o Alquimista. ­ Ou sua Lenda Pessoal era chegar at© aqui? ­ Existe uma guerra entre os cl£s. N£o © poss­vel cruzar o deserto. O Alquimista desceu do seu cavalo, e fez um sinal para que o rapaz entrasse com ele na tenda. Era uma tenda igual a todas as outras que havia conhecido no o¡sis ­ exceto a grande tenda central, que tinha o luxo dos contos de fada. ­ Ele procurou os aparelhos e fornos de alquimia, mas n£o encontrou nada. Havia apenas uns poucos livros empilhados, um fog£o para cozinhar, e os tapetes cheios de desenhos misteriosos. ­ Sente-se, que vou preparar um ch¡ ­ disse o Alquimista. E comeremos juntos estes gaviåes. O rapaz suspeitou que eram os mesmos p¡ssaros que havia visto no dia anterior, mas n£o disse nada. O Alquimista acendeu o fogo, e em pouco tempo um delicioso cheiro de carne enchia a tenda. Era melhor que o perfume dos narguil©s. ­ Por que quis me ver? ­ disse o rapaz. ­ Por causa dos sinais ­ respondeu o Alquimista ­ O vento me contou que vocª viria. E que ia precisar de ajuda. ­ N£o sou eu. ‰ o outro estrangeiro, o Inglªs. Ele © que o estava buscando. ­ Ele tem que encontrar outras coisas antes de me encontrar. Mas est¡ no caminho certo. Passou a olhar o deserto. ­ E eu? ­ Quando se quer uma coisa, todo o Universo conspira para que a pessoa consiga realizar seu sonho ­ disse o Alquimista, repetindo as palavras do velho rei. O rapaz entendeu. Outro homem estava no seu caminho, para conduzi-lo at© sua Lenda Pessoal. ­ Ent£o vocª vai me ensinar? ­ N£o. Vocª j¡ sabe de tudo que precisa. Vou apenas lhe fazer seguir em dire§£o ao seu tesouro. ­ Existe uma guerra entre os cl£s. ­ repetiu o rapaz. ­ Eu conhe§o o deserto. ­ J¡ encontrei meu tesouro. Tenho um camelo, o dinheiro das lojas de cristais, e cinqìenta moedas de ouro. Posso ser um homem rico na minha terra. ­ Mas nada disto est¡ perto das Pir¢mides ­ disse o Alquimista. ­ Tenho F¡tima. ‰ um tesouro maior que todo este que consegui juntar. ­ Tamb©m ela n£o est¡ perto das Pir¢mides. Comeram os gaviåes em silªncio. O Alquimista abriu uma garrafa e derramou um l­quido vermelho no copo do rapaz. Era vinho, um dos melhores vinhos que havia tomado em sua vida. Mas o vinho era proibido pela lei. ­ O mal n£o © o que entra na boca do homem ­ disse o Alquimista. ­ O mal © o que sai dela. O rapaz come§ou a sentir-se alegre com o vinho. Mas o Alquimista lhe inspirava medo. Sentaram-se do lado de fora da tenda, olhando o brilho da lua, que ofuscava as estrelas. ­ Beba e se distraia um pouco ­ disse o Alquimista, notando que o rapaz come§ava a ficar cada vez mais alegre. ­ Repouse como um guerreiro sempre repousa antes do combate. Mas n£o esque§a que o seu cora§£o est¡ onde est¡ o seu tesouro. E que seu tesouro precisa ser encontrado, para que tudo isto que vocª descobriu no caminho possa fazer sentido. "Amanh£ venda seu camelo e compre um cavalo. Os camelos s£o trai§oeiros: andam milhares de passos, e n£o d£o qualquer sinal de cansa§o. De repente, por©m, ajoelham e morrem. Os cavalos v£o se cansando aos poucos. E vocª poder¡ saber sempre o quanto pode pedir deles, ou a ©poca em que v£o morrer". Na noite seguinte o rapaz apareceu com um cavalo na tenda do Alquimista. Esperou um pouco e ele apareceu, montado em seu animal, e com o falc£o no ombro esquerdo. ­ Mostre-me a vida no deserto ­ disse o Alquimista. ­ Sã quem acha vida, pode encontrar tesouros. Come§aram a caminhar pelas areias, com a lua ainda brilhando sobre os dois. "N£o sei se vou conseguir encontrar vida no deserto", pensou o rapaz. "N£o conhe§o ainda o deserto". Quis virar-se e dizer isto ao Alquimista, mas tinha medo dele. Chegaram ao lugar de pedras, onde o rapaz havia visto os gaviåes no c©u; entretanto, tudo era silªncio e vento. ­ N£o consigo encontrar vida no deserto ­ disse o rapaz. Sei que ela existe, mas n£o consigo encontr¡-la. ­ A vida atrai a vida ­ respondeu o Alquimista. E o rapaz entendeu. Na mesma hora soltou as r©deas de seu cavalo e ele saiu livremente pelas pedras e areia. O Alquimista seguia em silªncio, e o cavalo do rapaz andou por quase meia-hora. J¡ n£o podiam mais ver as tamareiras do o¡sis, apenas a lua gigantesca no c©u, e as rochas brilhando com a cor prata. De repente, num lugar onde jamais havia estado antes, o rapaz notou que seu cavalo parava. ­ Aqui existe vida ­ respondeu o rapaz ao Alquimista. ­ N£o conhe§o a linguagem do deserto, mas meu cavalo conhece a linguagem da vida. Desmontaram. O Alquimista n£o disse nada. Come§ou a olhar as pedras, caminhando devagar. De repente, ele parou, e abaixou-se com todo cuidado. Havia um buraco no ch£o, entre as pedras; o Alquimista enfiou a m£o dentro do buraco, e depois enfiou o bra§o at© o ombro. Alguma coisa se mexeu l¡ dentro, e os olhos do Alquimista ­ ele sã podia ver os olhos ­ se encolherem de esfor§o e tens£o. O bra§o parecia lutar com o que estava dentro do buraco. Mas num salto que assustou o rapaz, o Alquimista retirou o bra§o e ficou imediatamente de p©. Sua m£o trazia unia serpente agarrada pelo rabo. O rapaz tamb©m deu um salto, sã que para tr¡s. A cobra debatia-se sem cessar, emitindo ru­dos e silvos que feriam o silªncio do deserto. Era uma naja, cujo veneno podia matar um homem em poucos minutos. "Cuidado com o veneno", chegou a pensar o rapaz. Mas o Alquimista havia colocado a m£o no buraco, e j¡ devia ter sido mordido. Seu rosto, por©m, estava tranqìilo. "O Alquimista tem duzentos anos", havia falado o Inglªs. J¡ devia saber como lidar com cobras no deserto. O rapaz viu quando seu companheiro foi at© o cavalo e puxou a longa espada em forma de meia-lua. Com ela, tra§ou um c­rculo no ch£o e colocou a cobra no meio. O animal aquietou-se imediatamente ­ Pode ficar tranqìilo ­ disse o Alquimista. ­ Ela n£o vai sair dali. E vocª descobriu a vida no deserto, o sinal que eu estava precisando. ­ Por que isto era t£o importante? ­ Porque as Pir¢mides est£o cercadas de deserto. O rapaz n£o queria ouvir falar nas Pir¢mides. Seu cora§£o estava pesado e triste, desde a noite anterior. Porque seguir em busca do seu tesouro, significava ter que abandonar F¡tima. ­ Vou gui¡-lo pelo deserto ­ falou o Alquimista. ­ Quero ficar no o¡sis ­ respondeu o rapaz. ­ J¡ encontrei F¡tima. E ela, para mim, vale mais que o tesouro. ­ F¡tima © uma mulher do deserto ­ disse o Alquimista. ­ Sabe que os homens devem partir, para poderem voltar. Ela j¡ encontrou seu tesouro: vocª. Agora espera que vocª encontre o que busca. ­ E se eu resolver ficar? ­ Ser¡ o Conselheiro do O¡sis. Tem ouro suficiente para comprar muitas ovelhas e muitos camelos. Vai casar-se com F¡tima e viver£o felizes o primeiro ano. Aprender¡ a amar o deserto e vai conhecer cada uma das cinqìenta mil tamareiras. Perceber¡ como elas crescem, mostrando um mundo que muda sempre. E ir¡ cada vez entender mais os sinais, porque o deserto © um mestre melhor que todos os mestres. "No segundo ano vocª se lembrar¡ que existe um tesouro. Os sinais come§ar£o a falar insistentemente sobre isto, e vocª tentar¡ ignor¡-los. Usar¡ seu conhecimento apenas para o bem-estar do o¡sis e dos seus habitantes. Os chefes tribais lhe agradecer£o por isto. Os seus camelos lhe trar£o riqueza e poder. "No terceiro ano os sinais continuar£o a falar sobre seu tesouro e sua Lenda Pessoal. Vocª vai ficar noites e noites andando pelo o¡sis, e F¡tima ser¡ uma mulher triste, porque fez com que seu caminho fosse interrompido. Mas vocª lhe dar¡ amor, e ser¡ correspondido. Vocª vai se lembrar que ela jamais pediu que ficasse, porque uma mulher do deserto sabe esperar seu homem. Por isso n£o vai culp¡-la. Mas vai andar muitas noites pelas areias do deserto, e por entre as tamareiras, pensando que talvez pudesse ter ido adiante, ter confiado mais no seu amor por F¡tima. Porque o que o manteve no o¡sis foi seu prãprio medo de n£o voltar nunca. E a esta altura, os sinais lhe indicar£o que seu tesouro est¡ enterrado para sempre. No quarto ano, os sinais o abandonar£o, porque vocª n£o quis ouvi-los. Os Chefes Tribais ir£o entender isto, e vocª ser¡ destitu­do do Conselho. A esta altura ser¡ um rico comerciante, com muitos camelos e muitas mercadorias. Mas passar¡ o resto dos seus dias vagando entre as tamareiras e o deserto, sabendo que n£o cumpriu sua Lenda Pessoal, e que agora © tarde demais para isto. "Sem jamais compreender que o Amor nunca impede um homem de seguir sua Lenda Pessoal. Quando isto acontece, © porque n£o era o verdadeiro Amor, aquele que fala a Linguagem do Mundo". O Alquimista desfez o c­rculo no ch£o, e a cobra correu e desapareceu entre as pedras. O rapaz lembrava o mercador de cristais que sempre quis ir   Meca, e o Inglªs que buscava um Alquimista. O ra